Se você tem interesse por temas que envolvam diversidade, equidade e inclusão, já deve ter ouvido falar em interseccionalidade.
Esse conceito é importante para qualquer pessoa que queira entender sobre formação identitária, comportamento e outros aspectos relacionados a grupos minorizados.
Ele ganha ainda mais destaque entre pessoas que ocupam cargos de liderança nas empresas e precisam lidar com as diferenças e as semelhanças que atravessam cada membro de suas equipes.
Neste texto, você vai descobrir o que é interseccionalidade, conferir exemplos e saber como é possível trabalhar com interseccionalidade nas empresas.
O que é interseccionalidade?
A interseccionalidade é um conjunto de marcadores sociais, econômicos, biológicos e psicológicos que, embora sejam diferentes, incidem sobre alguém em simultâneo.
O termo ganhou visibilidade por meio do trabalho da professora e advogada norte-americana Kimberlé Crenshaw no final dos anos 1980.
Em 2018, durante entrevista ao National Association of Independent Schools (NAIS), ela definiu interseccionalidade como:
“Interseccionalidade é uma metáfora para entender as maneiras pelas quais múltiplas formas de desigualdade ou desvantagem, às vezes se compõem e criam obstáculos que muitas vezes não são compreendidos nas formas convencionais de pensar antirracismo ou feminismo ou quaisquer estruturas de defesa da justiça social”.
Esse conceito fica mais fácil de identificar quando analisamos dados de gênero, raça e classe. No Brasil, as mulheres negras ganham menos que mulheres brancas que, por sua vez, ganham menos que homens brancos, ainda que a formação educacional seja a mesma.
Uma pesquisa do Instituto Insper com base em dados do IBGE de 2016 a 2018 mostrou que homens brancos ganham até 159% a mais que mulheres negras no mercado de trabalho.
Assim, percebemos que existe um problema não só de raça, mas também de discriminação de gênero. Ambos andam juntos e é impossível dissociá-los.
Exemplo de interseccionalidade
Para facilitar ainda mais a compreensão de como a interseccionalidade pode ser identificada no cotidiano, vamos imaginar a história de Dandara, uma advogada de 32 anos.
Dandara também é uma mulher negra e deficiente física. Ela trabalha em uma grande empresa do ramo alimentício. Desde sua primeira semana de trabalho presencial, Dandara percebeu que não havia um banheiro adaptado no andar onde fica sua sala, ela ainda é a única pessoa negra da equipe e alguns de seus colegas evitam falar com ela.
Ela entende que além da falta de acessibilidade na empresa, existe um racismo institucional. Visto que algumas pessoas naquele ambiente não conseguem enxergá-la como uma nova colega, capaz de exercer as mesmas funções que os outros de igual cargo.
Dandara não é capaz de dizer qual desses obstáculos a prejudicam mais, pois eles coexistem. Ela não pode ser só uma mulher negra ou apenas uma PcD. Portanto, todos esses aspectos de sua identidade se cruzam, e é isso que chamamos de interseccionalidade.
O entendimento do que é interseccionalidade nos ajuda a compreender diversas identidades e como essas identidades se formam e são aceitas (ou não) pela sociedade.
Qual a importância de entender o que é interseccionalidade?
Nos últimos anos, o conceito de interseccionalidade ganhou força e compreender a importância do termo deve fazer parte dos responsáveis pela criação de políticas públicas. Bem como, da rotina de qualquer pessoa que deseja investir em políticas de D&I.
Inclusive, não só por uma questão moral e social, mas por uma visão estratégica de mercado. Visto que as empresas precisam pensar no público que querem alcançar, em suas expectativas e mudanças de comportamento.
E se você ainda está na dúvida se pensar na interseccionalidade de grupos minorizados vale a pena, saiba que:
- mais da metade da população (56,1%) se considera negra ou parda no Brasil.
- aproximadamente, 9% da população de pessoas se declaram pertencentes à comunidade LGTQIAP+;
- existem cerca de 17,2 milhões de PcDs no país;
- até 2060, podemos ter mais 70 milhões de pessoas com mais de 60 anos no Brasil, segundo estimativas do IBGE.
O que a interseccionalidade nos motiva a refletir é: quantas dessas identidades se cruzam? Quantas pessoas são, ao mesmo tempo, negras e bissexuais, trans e PcDs, 50+ e gays ou lésbicas? E como a sua empresa é capaz de compreender o que isso significa na vida dessas pessoas e as relações que estabelecem?
É fundamental que você entenda que a interseccionalidade é atravessada por questões como: racismo estrutural, machismo, capacitismo, homofobia, preconceito etário, etc.
Problemas que ajudaram e ainda ajudam a formar estereótipos.
O que são estereótipos?
Estereótipos são pensamentos e ideias padronizadas e equivocadas construídas sobre uma ou mais pessoas. Eles também podem se manifestar como vieses inconscientes.
Quer um exemplo? Evitar contratar mulheres que são mães, pois elas tenderiam a ter mais dificuldade de executar tarefas já que ficam mais dispersas, preocupadas com os filhos.
Sendo assim, estereótipos podem e devem ser combatidos, principalmente no ambiente corporativo.
Como lidar com a interseccionalidade nas empresas?
Diante de tudo que foi visto, é preciso trabalhar o planejamento estratégico da empresa integrado a políticas de DEI e com essa visão interseccional.
Por isso, seguem algumas dicas para que a interseccionalidade nas empresas seja compreendida por meio de ações.
Evite julgamentos padronizados
Uma mulher branca não têm as mesmas dificuldades que uma mulher negra. E uma mulher negra não possui as mesmas dificuldades que outra mulher negra, visto que há outros aspectos que perpassam a vida de cada uma.
Tenha um olhar interseccional e evite comparações generalistas.
Pratique a comunicação inclusiva
Em comunicados internos ou campanhas externas, preste atenção na imagem que a empresa está passando. A linguagem utilizada busca ser inclusiva? E as imagens usadas em campanhas de marketing, costumam mostrar grupos diversos de pessoas?
Considere a aceleração de carreira para grupos minorizados
Ao considerar a interseccionalidade, é válido investir em ações afirmativas nas empresas. Isso inclui ter um olhar específico para a progressão dos planos de carreira de grupos minorizados dentro da organização.
Crie estruturas de segurança para denúncias
A empresa trabalha para que casos de racismo ou qualquer outro tipo de discriminação nunca ocorram, mas sabemos que eles ainda podem acontecer.
Portanto, as pessoas precisam sentir que estão em um espaço corporativo preparado para acolher situações como essa. E que o ambiente possui canais que permitem o endereçamento seguro de casos de racismo, por exemplo.
Para continuar aprendendo outros conceitos relacionados à diversidade, leia o texto: “Lugar de fala: o que é e qual a sua importância nas políticas de diversidade e inclusão“.