Ou, como explicou Silvio Almeida em seu livro sobre Racismo Estrutural “A desigualdade racial é uma característica da sociedade não apenas por causa da ação isolada de grupos ou indivíduos racistas, mas por as instituições serem hegemonizadas por determinados grupos raciais que utilizam mecanismos institucionais para impor seus interesses políticos e econômicos.”

São esses mecanismos que fazem com que a população negra seja a maioria de pessoas sem emprego, atuando em serviços subalternos e sendo maiores vítimas de discriminação e repressão policial.

Mas esse cenário vem mudando, devagar, mas vem mudando. Dados do IBGE comprovam que na virada do século XX para o XXI, pessoas negras ocupavam 2% das vagas de universidades públicas e privadas. Em 2019, estudantes pretos e pardos eram maioria nas universidades públicas pela primeira vez.

Ações afirmativas e movimentos sociais que oferecem cursinhos solidários ajudaram a mudar este cenário. A empresa antirracista, portanto, deve se inspirar nas cotas raciais das universidades para ampliar o acesso de pessoas negras no mercado de trabalho.

Vamos descobrir por onde começar?

O papel da empresa antirracista

Já falamos que as instituições historicamente ajudam a reforçar o racismo da sociedade. E, ancorada na meritocracia, responsabiliza a pessoa negra pela própria jornada. “A desigualdade só vai acabar quando pessoas negras tiverem acesso à educação de qualidade” é uma frase recorrente pelo senso comum.

Contudo, embora as pessoas negras tenham mais acesso ao ensino superior, continuam ocupando cargos de níveis auxiliar e operacionais (47,6%) e, menos de 1%, chega aos cargos de decisão? Os dados estão nesta reportagem da revista Exame que ainda usou uma pesquisa do Insper para mostrar que o salário dos homens brancos é 159% superior ao das mulheres negras.

É neste contexto que a empresa antirracista chega para transformar o mercado de trabalho: ampliar o número de pessoas negras no quadro funcional não é suficiente. É fundamental investir em políticas de diversidade, equidade e inclusão para fazer com que essas pessoas continuem nas empresas, se desenvolvam, cresçam com a organização e se sintam acolhidas e respeitadas por todos e todas.

Luíza Trajano do Magazine Luiza, empresa conhecida  pelas ações de diversidade e inclusão, explicou em entrevista ao jornalista Maurício Pestana que “Você pode contratar várias pessoas negras, mas chegará o dia em que perceberá que o problema é muito mais sério do que você imaginava”. Para ela, não adianta estabelecer normas e programas se não conseguimos aumentar o nível de consciência.

Ela explicou ainda que só depois da criação de comitês para discutir assuntos relacionados à diversidade, igualdade e gênero é possível ser mais assertivo para criar programas de seleção, treinamentos, entre outros.

A Magazine Luíza foi bastante questionada ao criar o primeiro programa de trainee exclusivo para pessoas negras. E quando Maurício Pestana perguntou sobre as cotas raciais no mercado de trabalho, ela foi enfática ao afirmar que “quando as pessoas entendem exatamente o que são as cotas, é difícil ficarem contra.

Isso porque, as cotas raciais, são um processo transitório. Assim como acontece nas universidades, no mercado de trabalho essas ações afirmativas têm o objetivo de corrigir um erro. A empresa antirracista, portanto, pode implementar essas ações afirmativas para reverter um processo de desigualdade e ampliar o acesso e permanência de pessoas negras no mercado de trabalho.

No artigo, Diversidade nas empresas: 5 razões para você criar uma política de diversidade você pode conhecer os vários benefícios de desenvolver diversidade e inclusão com intencionalidade em sua empresa.

Como trabalhar ações afirmativas

Em seu livro, Empresa antirracista: como CEOs e altas lideranças estão agindo para incluir negros e negras nas grandes corporações, o jornalista Maurício Pestana pontuou  três tipos de ações afirmativas que podem ser colocadas em prática nas empresas.

Ações afirmativas nas estruturas organizacionais

Nesta esfera entra criar trainees exclusivos para pessoas negras como o da Magazine Luísa. Além disso, é possível criar a intenção de aumentar o número de pessoas negras, principalmente em cargos sêniores, especialistas e lideranças. Uma forma de colocar isso em prática é tornar os processos seletivos mais inclusivos.

Inclusive, escrevemos um artigo contando os benefícios da liderança inclusiva para o desenvolvimento das organizações.

Ações afirmativas na rede de fornecedores

Como o próprio nome já diz, essa ação afirmativa consiste em contratar fornecedores e fornecedoras negras na cadeia produtiva. Nos Estados Unidos, essa prática é bastante comum, mas aqui no Brasil caminha a passos largos.

Uma prova disso é que a Prefeitura de São Paulo fez uma pesquisa em sua cadeia de fornecedores e descobriu que existe uma participação importante de mulheres em cargos de gestão, mas quando se aplica o recorte de raça, descobre-se que essas mulheres são brancas.

Ações afirmativas por de meio de patrocínios

O objetivo aqui é apoiar iniciativas da sociedade civil voltadas para gênero e raça. E existem muitos projetos que podem ser apoiados. Como o Movimento Black Money, que empodera afroempreendedores e conta inclusive com um marketplace voltado para pessoas negras oferecerem seus serviços.

Além disso, é possível apoiar programas de treinamentos para que possam oferecer bolsas, espetáculos que tenham como foco a temática de raça e gênero e muito mais!

O importante é deixar esse canal de comunicação aberto para que as pessoas possam chegar em sua empresa antirracista.

O que fazer além das ações afirmativas?

Uma das premissas importantes para a empresa antirracista é envolver todo o quadro de funcionários. Contudo, as políticas de diversidade, equidade e inclusão devem vir de cima. E não apenas do comitê de diversidade, RH, compliance, mas também dos CEOs.

Em entrevista para a Revista Raça, o CEO da Fundação Dom Cabral, Theo Van Der Loo, destacou a importância do envolvimento dos CEOs nas políticas de diversidade racial nas empresas. Segundo ele, é o CEO que confere o tom ao projeto.

E afirma: “Na minha experiência, se a gente não se envolver e não der o exemplo para a empresa, vamos sair bem na foto, vamos dizer que fazemos também diversidade, inclusão, mas temos que ser proativos.”

Na mesma entrevista, ele falou ainda sobre o protagonismo da comunidade negra no acesso de pessoas negras no mercado de trabalho, destacando o papel da pessoa branca na luta antirracista: “Sejamos sinceros, o branco é que tem o poder, é o que discrimina,  historicamente foi ele que gerou essa situação, e ele, portanto, é parte importante da solução.”

Quais os desafios?

Uma empresa precisa gerar lucro, isso é inegável, mas deve também acompanhar o desenvolvimento e transformação da sociedade. No mundo em que tudo muda o tempo todo e o avanço tecnológico fez com que pessoas que não tinham voz passassem a usar as redes sociais para pedir lugar de fala e, para além disso, a população está consumindo de forma mais consciente, as empresas devem assumir compromissos éticos.

Para as empresas que querem ganhar competitividade e seguirem crescendo de forma sustentável é preciso assumir uma posição de empresa antirracista. As altas lideranças e também o comitê de diversidade contam com o desafio de entregar valor para o cliente, aumentar os indicadores financeiros, mas também contribuir para uma sociedade mais justa e quebre os círculos viciosos do racismo estrutural.

Se você não sabe ainda como dar o primeiro passo rumo a empresa antirracista, conheça o trabalho da Singuê. E veja como iniciar as políticas de diversidade, equidade e inclusão em sua empresa. Para entrar em contato, basta clicar aqui.