Quem são os povos originários do Brasil e por que preservar sua identidade
Com o crescente debate em torno do aquecimento global e mudanças climáticas, a sociedade tem se preocupado em como devemos enfrentar essa questão. Devido a isso, é cada vez mais comum, notícias vinculando a proteção do meio ambiente com a luta dos povos originários do Brasil.
São chamados de povos originários aqueles grupos cujos seus ancestrais foram os primeiros habitantes do território. Eles também são conhecidos como povos indígenas. As datações arqueológicas mais seguras apontam que, o nosso continente, já era povoado por eles há pelo menos 30 mil anos.
Vistos como guardiões da biodiversidade, esses povos enfrentam ameaças à manutenção de suas culturas e de suas vidas. Atualmente, apenas na região amazônica, Terras Indígenas (TI) em conjunto com Unidades de Conservação Permanente, ainda mantêm cerca de 90% da vegetação nativa.
Apesar disso, essas populações são afetadas pelo racismo ambiental e pelos interesses privados e do Estado. Isso prejudica o seu modo de vida e viola os seus direitos fundamentais.
Mesmo após a ratificação brasileira da Convenção 169, a luta pela terra é uma das principais preocupações dos indígenas. O documento, editado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), garante a consulta prévia a essas comunidades antes que algum projeto seja realizado nas TI’s.
Nesse conteúdo, conheça a importância dos povos indígenas para o Brasil e para o mundo e qual o motivo de promover a preservação da sua identidade.
Povos originários e povos tradicionais: qual a diferença?
O Decreto n.º 6.040, de 7 de fevereiro de 2007, instituiu que povos e comunidades tradicionais são “grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais”. Esses grupos possuem organização social própria e dependem do seu território tradicional para a manutenção da sua cultura e identidade.
Dessa maneira, povos originários estão incluídos na categoria social de povos e comunidades tradicionais. Porém, se diferenciam principalmente pela sua relação milenar de identidade e memória com o atual território brasileiro.
As estimativas atuais demonstram que o número de indivíduos que se declaram indígenas aumentou cerca de 66% em menos de 10 anos. São mais de 305 etnias e 274 idiomas.
Entretanto, é preciso pontuar que as estratégias de opressão colonial agem de maneira a coibir a manifestação e preservação do pertencimento desses grupos.
A pesquisadora do povo Guarani, Geni Núñez, aponta que apenas em 1991 o termo indígena foi incluído no Censo. Ao longo da história houveram muitas formas de racializar esses grupos, chamando-os pelos termos caboclos, pardos, mestiços, bugres, morenos, cabras, entre outros.
Quase metade deles residem nos grandes centros urbanos e muitos precisam esconder a identidade como maneira de sobrevivência. Por isso, é importante que a promoção da diversidade étnica nas empresas esteja alinhada para incluir as realidades indígenas.
Povos Indígenas: a importância da sua identidade e memória
Com a redemocratização do país, o estabelecimento da Constituição Federal de 1988 e o Código Civil de 2002, a população originária saiu do status jurídico de tutelados pelo Estado. O reconhecimento legal da sua autonomia possibilitou outro olhar sobre os grupos.
O pensamento racista impôs que os povos indígenas no Brasil estavam ao ponto da extinção, devido a uma suposta categoria social de transição. Eles precisavam ser civilizados e suas culturas entendidas como inferiores e selvagens.
Mas, na luta pelo direito à existência, essas comunidades lembram a importância da preservação das suas identidades para todo o planeta. Durante o evento Rio-92 publicaram a ‘Carta da Terra dos Povos Indígenas’. A conferência foi organizada pela ONU e o documento reforçou que não são apenas os povos originários que precisam da manutenção da vida natural, mas todos os seres vivos.
A valorização da cultura indígena contribui para o fortalecimento da sua memória e para compreensão de que os seus conhecimentos são de extrema importância na construção de um futuro melhor para o país e para o planeta.
O mercado também deve estar atento a sua responsabilidade social e aos impactos que os seus negócios causam no mundo. Diversidade e sustentabilidade são dois conceitos que não podem ser separados. Caminham lado a lado com a garantia de direitos dos povos indígenas.
Empresas que demonstram essa preocupação, possuem seus ativos muito mais valorizados.
Na cultura organizacional devem ser adotadas práticas antirracistas que permitam a expressão de diversas maneiras de pensar e de ser. Igualmente, pode-se adotar um calendário de diversidade, incluindo marcos importantes para esses grupos.
Políticas públicas e os povos originários
Por muitos séculos, os saberes originários foram sistematicamente combatidos. Após muita luta e resistência desses grupos, políticas públicas estão sendo criadas para a inclusão das pessoas indígenas. Porém, elas não são efetivamente aplicadas.
Alguns mecanismos, como a Lei nº 11.645, de 10 março de 2008, que tornou obrigatório o ensino da temática indígena e afro-brasileira nas escolas, são importantes. A realidade, entretanto, demonstra que percepções racistas ainda são ensinadas às crianças e adolescentes.
Datas como o dia 19 de abril são chamadas de ‘dia do índio’, em alusão ao nome inventado pelos colonizadores para nomear as populações nativas. O escritor indígena Daniel Munduruku, afirma que a data reforça a ideia pejorativa de que existe um modelo de ‘ser indígena’, apagando a diversidade histórica desses povos.
Além disso, o termo ‘índio’ é uma estratégia estabelecida pela branquitude para diminuir e menosprezar as tradições e pertencimento das nações indígenas. Por isso, na consultoria de diversidade, repensar o vocabulário é uma estratégia que deverá ser adotada.
Outra conquista são as ações afirmativas. Elas são relevantes, pois abriram o caminho para a entrada dessas comunidades no ensino superior. Muitas delas, principalmente aquelas mais distantes das cidades, ainda falam as suas línguas indígenas. Assim, deve-se melhorar cada vez mais o acesso de minorias nesses espaços.
O ensino escolar diferenciado e as políticas de permanência na universidade, também são significativas para que os povos originários do Brasil, possam demonstrar que valorizar suas tradições, não é sinônimo de atraso.
As instituições devem estar preparadas para uma gestão de diversidade que valorize essas pessoas, suas experiências e conhecimentos. Elas trazem novas ideias e percepções para enfrentar os desafios que aparecem no dia a dia do trabalho.
Em razão disso, entenda como a ancestralidade está presente na vida de grupos diversos e como se relaciona com o mercado de trabalho.
Por que a democracia racial no Brasil é um mito que deve ser combatido?
O Brasil é um dos países que possui maior diversidade étnica e cultural. Entretanto, isso não significa uma convivência pacífica e com equidade entre todos esses grupos. Por isso, não é possível afirmar a existência de uma democracia racial no país.
Desde o tráfico transatlântico de africanos, pessoas negras têm sofrido com uma série de violências físicas, mentais e espirituais. O racismo, ainda vigente, afeta negativamente a vida desses indivíduos. As baixas remunerações salariais são uma dessas consequências. Segundo uma pesquisa do IBGE, negros ganham cerca de 45% a menos do que brancos.
Essas condições contribuem para perpetuar a discriminação racial e o preconceito. Também ajudam a manter o privilégio branco. Dessa maneira, é preciso encarar de frente a realidade de opressão que pessoas não-brancas vivem.
Entenda com este conteúdo o que democracia racial, como as políticas públicas contribuem para combater as desigualdades e a importância das políticas institucionais para promover a reparação histórica.
O mito da democracia racial
É notório observar como grande parte da população brasileira possui mais de uma origem ancestral. O principal motivo disso é porque a miscigenação foi utilizada como estratégia de dominação. Através das violências sexuais, brancos submetiam pessoas negras e indígenas ao branqueamento populacional, controle da terra e etnocídio.
Para o sociólogo Gilberto Freyre (1933), a miscigenação foi responsável pelo equilíbrio entre todas as raças no país. Essa visão vai ao encontro do conceito denominado de democracia racial.
Elaborado pelo médico e antropólogo Arthur Ramos, democracia racial é a ideia da existência de uma suposta harmonia racial. Nela, não existiriam os diversos tipos de racismos, como o racismo estrutural. Todas as pessoas seriam tratadas igualmente, com acesso aos mesmos direitos e oportunidades.
Com o fim da escravidão institucionalizada e com a fundação da república, houve a necessidade de fortalecer a criação de uma identidade nacional. Por isso, intelectuais como Florestan Fernandes (1966), denunciavam esse pensamento como o mito da democracia racial.
Ainda hoje, a ausência de leis segregacionistas, como o Apartheid, é utilizada para justificar uma visão errônea da existência de equidade entre negros e brancos. Para muitos, o passado de escravidão já foi superado.
Obviamente a população negra não sente e não é tratada dessa maneira. É preciso criar meios de vencer os efeitos nefastos de um passado que ainda gera desigualdades raciais.
A luta por políticas públicas para negros no Brasil
Ao longo da história, diversas políticas públicas foram utilizadas para fortalecer os privilégios de grupos dominantes. Todavia, após séculos de luta, ferramentas institucionalizadas como as ações afirmativas estão mudando a realidade de pessoas negras em muitos lugares. No Brasil, essa realidade aos poucos vai se concretizando.
Entenda como isso vem acontecendo!
Lei de terras
A Lei de Terras de 1850, garantiu a privatização da terra, o roubo de territórios indígenas e a manutenção de uma estrutura que apenas beneficiou latifundiários. De acordo com ela, o direito à propriedade seria garantido apenas para quem pudesse comprar ou comprovasse herança.
Fluxos migratórios europeus no Brasil
No final do século XIX e início do século XX, o desejo do Estado era transformar a sociedade brasileira em um espelho da Europa. Além disso, havia a necessidade de expandir a exploração das terras em outras regiões do território. Para isso, era necessário torná-lo majoritariamente branco.
Desse modo, houve um incentivo institucional à migração de famílias europeias, responsável pela vinda de cerca de 4 milhões de pessoas.
Restrição do direito ao voto
Após o final do período imperial, apenas homens com escolaridade possuíam direito ao voto. Essa restrição impossibilitou que a população negra obtivesse o direito de escolher seus representantes.
Movimento negro organizado
Na década de 1930 surge o primeiro grupo negro organizado, conhecido como Frente Negra Brasileira. Foi a primeira entidade formada exclusivamente por pessoas negras. Em sua maioria era composto por professores e funcionários públicos.
Além de financiar encontros, foi responsável pela publicação do jornal A Voz da Raça. As pautas eram voltadas para combater o racismo e exigir políticas públicas.
Foi percursora para que, em 1978, o Movimento Negro Unificado Contra da Discriminação Racial - MNUDCR fosse fundado.
Promoção da igualdade racial nas políticas públicas
A redemocratização do país e o estabelecimento da atual Constituição Federal é símbolo de muita luta e conquistas. Após tantos séculos de exclusão, negros e negras puderam ocupar espaços e expressar o seu lugar de fala.
Veja alguns avanços das últimas décadas:
- Criação da Fundação Cultural Zumbi dos Palmares, vinculada ao Ministério da Cultura (1988);
- Formação do Grupo de Trabalho Interministerial de Valorização da População Negra (1995);
- Surge o Conselho Nacional de Combate à Discriminação (2001);
- Estabelecimento do Programa Nacional de Ações Afirmativas (2002), reconhecendo a importância de políticas voltadas para pretos e pardos como instrumento de combate às desigualdades e ao racismo;
- Criação do Estatuto da Igualdade Racial (2010);
- Lançamento da Lei n°12.711 (2012), grantindo equidade no ingresso no ensino superior para negros, indígenas e pessoas com deficiência.
A importância de políticas institucionais para fomentar a reparação histórica no país
A conquista de direitos e oportunidades para pessoas pretas e pardas avançou nos últimos 20 anos. Por isso, é importante a continuidade em promover espaços livres do racismo institucional e estrutural.
Empresas públicas e privadas precisam estar atentas para superar os entraves burocráticos, raciais, de gênero, entre outros, que impossibilitam a construção de ambientes diversos.
Institucionalizar ações é uma das formas possíveis para legitimar políticas que verdadeiramente transformam a realidade. Porém, é importante não esquecer que ainda há muitas vitórias para alcançar.
Para exercer boas práticas de equidade e inclusão é preciso compromisso para conseguir contribuir com os anseios da população por uma nova sociedade.
Convidamos a continuar conosco e conhecer a Lei de Inclusão Social e a sua importância.
3 livros sobre inclusão para ajudar a refletir sobre o tema
Não é possível pensar no futuro do trabalho sem que políticas de D&I (Diversidade, Equidade e Inclusão) sejam estabelecidas nas organizações. Elas devem ser duradouras e necessitam de uma metodologia bem elaborada.
Para mudanças efetivas se faz necessário uma transformação de conceitos, perspectivas e ações no ambiente de trabalho. Uma estratégia muito importante é o acesso a livros sobre inclusão.
Apesar do crescente debate sobre o assunto, muitas empresas não conseguem desenvolver um planejamento que mude e fortaleça as relações internas da empresa. Quando isso acontece, é comum caso de violências sistemáticas contra o grupo minoritário envolvido.
A leitura e o estudo são instrumentos de mudanças poderosos. Dessa forma, listamos três livros sobre inclusão no mercado de trabalho que podem ajudar a sua equipe.
Saiba mais logo abaixo!
O papel dos livros sobre inclusão como ferramenta da agenda D&I no mercado de trabalho
Há um forte crescimento no debate sobre o impacto da diversidade e da inclusão nas empresas. A competitividade do mercado e as mudanças de comportamento do consumidor afetam essas dinâmicas. Ao mesmo tempo, a luta de grupos excluídos por acesso aos seus direitos move a sociedade.
A pesquisa realizada pela STARZ em parceria com a UCLA, revelou que para 57,4% das pessoas entrevistadas é importante a presença de pessoas de origens diversas na equipe de produção audiovisual.
Porém, não é só nas mídias que a busca por diversidade impacta os consumidores. O mercado do livro também é gerador de mudanças para inclusão nas empresas.
Além dos romances com personagens diversos, a literatura de não-ficção pode ser utilizada como uma ferramenta da agenda D&I no mundo corporativo.
Para seguir boas metodologias de gestão de diversidade, conheça três livros para aprofundar os seus conhecimentos na importância da inclusão nas empresas.
Como empoderar pessoas com deficiência: um guia para transformar limitações em autonomia e independência
Para pessoas com deficiência a Lei de Inclusão Social é um mecanismo que contribui para assegurar acesso ao trabalho digno. Porém, para uma sociedade inclusiva, não basta apenas oferecer oportunidades. É preciso a quebra de estereótipos limitantes.
Alex Duarte buscou superar esse desafio ao escrever o livro Como empoderar pessoas com deficiência: um guia para transformar limitações em autonomia e independência (Champion Editora).
O cineasta, escritor e educador social é o idealizador dos projetos Cromossomo 21 e Expresso 21. Este último diz respeito ao treinamento realizado junto às pessoas com deficiência intelectual. Foi a primeira imersão com esse objetivo da América Latina. Todo o processo foi registrado e transformado em documentário.
O livro é resultado dessa experiência e propõe ideias e ações de como familiares, empresários e educadores podem colaborar para o empoderamento e autonomia de pessoas com deficiência.
As crenças preconcebidas por pessoas sem deficiência dificultam o desenvolvimento desses sujeitos. Ocorre então restrições de liberdade e possibilidades, como a progressão de carreira.
Os capítulos estão divididos de maneira que cada pessoa possa compreender as etapas necessárias desse processo. Alex também pontua a importância de conhecer os mecanismos legais de proteção aos direitos das pessoas com deficiência.
A última parte do livro é voltada para o ensinamento de técnicas que oferecem meios de promover uma cultura de inclusão em diversos ambientes. Essas técnicas como Rapport e Ancoragem podem ser utilizadas no espaço de trabalho.
Essas metodologias são ferramentas que ajudam na efetivação da política de diversidade e inclusão, a superar barreiras institucionais e melhoram o sentimento de pertencimento da equipe colaboradora.
Imperfeitos: Um relato íntimo de como a inclusão e a diversidade podem transformar vidas e impactar o mercado de trabalho
Ao conhecer sobre uma realidade é fundamental que seja também a partir de quem a vive pessoalmente. Ler livros sobre inclusão pode ser uma oportunidade de ter acesso ao lugar de fala de grupos que enfrentam a negação sistemática dos seus direitos.
É isso que Julie Goldchmit trás em seu livro Imperfeitos: Um relato íntimo de como a inclusão e a diversidade podem transformar vidas e impactar o mercado de trabalho (Maquinaria Editorial). Ela é uma mulher com Transtorno do Espectro Autista e trabalha como assistente de marketing.
No livro, apresenta a dimensão de todos os obstáculos que enfrentou na vida pessoal e no ambiente de trabalho. Precisou lidar com a invisibilidade, que só aumentou após o diagnóstico tardio na adolescência.
Durante as buscas por um emprego seus conhecimentos e habilidades não foram valorizados, apesar dos programas de inclusão nos quais esteve inserida. No Brasil, estima-se que 85% das pessoas no espectro autistas estão fora do espaço de trabalho.
Julie Goldchmit trabalha atualmente em uma empresa multinacional. O relato em primeira pessoa oferece o tom principal do livro. Entretanto, ele é enriquecido com a análise dos dados de pesquisas feitas por psicólogos e especialistas na área. Outro ponto importante é o relato de colegas de trabalho e dos gestores.
Isso demonstra a importância de lideranças comprometidas com a inclusão em todos os níveis. Não basta investir apenas no recrutamento, oferecendo vagas exclusivas para PcDs. A política de inclusão vai além: é preciso a mudança da cultura organizacional.
A empresa antirracista: Como CEOs e altas lideranças estão agindo para incluir negros e negras nas grandes organizações
No Brasil, as relações de trabalho também são afetadas pelo racismo estrutural. Mesmo com a pauta racial ganhando espaço nas empresas, ainda há muito o que fazer. Segundo a pesquisa da Korn Ferry, uma pessoa negra precisa trabalhar o dobro para conseguir espaço como liderança.
Maurício Pestana é autor de um dos livros mais importantes da atualidade sobre inclusão nas instituições. Jornalista e gestor empresarial, escreveu o livro A empresa antirracista: Como CEOs e altas lideranças estão agindo para incluir negros e negras nas grandes organizações (Agir).
No livro, o autor realiza uma série de entrevistas com CEO’s de diversas empresas, brasileiras e multinacionais. Ele investiga quais são as medidas que essas organizações têm tomado para garantir mais diversidade dentro dos espaços de trabalho.
Para além dessas estratégias de inclusão, Maurício pontua a importância de assegurar a segurança e integridade dos colaboradores negros. Isso só pode ser alcançado através de práticas antirracistas nas empresas.
Por esse motivo, é fundamental ler e buscar informações de qualidade para que as relações no espaço de trabalho sejam acolhedoras e respeitosas. Veja qual o papel da liderança inclusiva para fortalecer a equipe colaboradora.
Interseccionalidade: o que é e como influencia as relações no trabalho?
Se você tem interesse por temas que envolvam diversidade, equidade e inclusão, já deve ter ouvido falar em interseccionalidade.
Esse conceito é importante para qualquer pessoa que queira entender sobre formação identitária, comportamento e outros aspectos relacionados a grupos minorizados.
Ele ganha ainda mais destaque entre pessoas que ocupam cargos de liderança nas empresas e precisam lidar com as diferenças e as semelhanças que atravessam cada membro de suas equipes.
Neste texto, você vai descobrir o que é interseccionalidade, conferir exemplos e saber como é possível trabalhar com interseccionalidade nas empresas.
O que é interseccionalidade?
A interseccionalidade é um conjunto de marcadores sociais, econômicos, biológicos e psicológicos que, embora sejam diferentes, incidem sobre alguém em simultâneo.
O termo ganhou visibilidade por meio do trabalho da professora e advogada norte-americana Kimberlé Crenshaw no final dos anos 1980.
Em 2018, durante entrevista ao National Association of Independent Schools (NAIS), ela definiu interseccionalidade como:
“Interseccionalidade é uma metáfora para entender as maneiras pelas quais múltiplas formas de desigualdade ou desvantagem, às vezes se compõem e criam obstáculos que muitas vezes não são compreendidos nas formas convencionais de pensar antirracismo ou feminismo ou quaisquer estruturas de defesa da justiça social”.
Esse conceito fica mais fácil de identificar quando analisamos dados de gênero, raça e classe. No Brasil, as mulheres negras ganham menos que mulheres brancas que, por sua vez, ganham menos que homens brancos, ainda que a formação educacional seja a mesma.
Uma pesquisa do Instituto Insper com base em dados do IBGE de 2016 a 2018 mostrou que homens brancos ganham até 159% a mais que mulheres negras no mercado de trabalho.
Assim, percebemos que existe um problema não só de raça, mas também de discriminação de gênero. Ambos andam juntos e é impossível dissociá-los.
Exemplo de interseccionalidade
Para facilitar ainda mais a compreensão de como a interseccionalidade pode ser identificada no cotidiano, vamos imaginar a história de Dandara, uma advogada de 32 anos.
Dandara também é uma mulher negra e deficiente física. Ela trabalha em uma grande empresa do ramo alimentício. Desde sua primeira semana de trabalho presencial, Dandara percebeu que não havia um banheiro adaptado no andar onde fica sua sala, ela ainda é a única pessoa negra da equipe e alguns de seus colegas evitam falar com ela.
Ela entende que além da falta de acessibilidade na empresa, existe um racismo institucional. Visto que algumas pessoas naquele ambiente não conseguem enxergá-la como uma nova colega, capaz de exercer as mesmas funções que os outros de igual cargo.
Dandara não é capaz de dizer qual desses obstáculos a prejudicam mais, pois eles coexistem. Ela não pode ser só uma mulher negra ou apenas uma PcD. Portanto, todos esses aspectos de sua identidade se cruzam, e é isso que chamamos de interseccionalidade.
O entendimento do que é interseccionalidade nos ajuda a compreender diversas identidades e como essas identidades se formam e são aceitas (ou não) pela sociedade.
Qual a importância de entender o que é interseccionalidade?
Nos últimos anos, o conceito de interseccionalidade ganhou força e compreender a importância do termo deve fazer parte dos responsáveis pela criação de políticas públicas. Bem como, da rotina de qualquer pessoa que deseja investir em políticas de D&I.
Inclusive, não só por uma questão moral e social, mas por uma visão estratégica de mercado. Visto que as empresas precisam pensar no público que querem alcançar, em suas expectativas e mudanças de comportamento.
E se você ainda está na dúvida se pensar na interseccionalidade de grupos minorizados vale a pena, saiba que:
- mais da metade da população (56,1%) se considera negra ou parda no Brasil.
- aproximadamente, 9% da população de pessoas se declaram pertencentes à comunidade LGTQIAP+;
- existem cerca de 17,2 milhões de PcDs no país;
- até 2060, podemos ter mais 70 milhões de pessoas com mais de 60 anos no Brasil, segundo estimativas do IBGE.
O que a interseccionalidade nos motiva a refletir é: quantas dessas identidades se cruzam? Quantas pessoas são, ao mesmo tempo, negras e bissexuais, trans e PcDs, 50+ e gays ou lésbicas? E como a sua empresa é capaz de compreender o que isso significa na vida dessas pessoas e as relações que estabelecem?
É fundamental que você entenda que a interseccionalidade é atravessada por questões como: racismo estrutural, machismo, capacitismo, homofobia, preconceito etário, etc.
Problemas que ajudaram e ainda ajudam a formar estereótipos.
O que são estereótipos?
Estereótipos são pensamentos e ideias padronizadas e equivocadas construídas sobre uma ou mais pessoas. Eles também podem se manifestar como vieses inconscientes.
Quer um exemplo? Evitar contratar mulheres que são mães, pois elas tenderiam a ter mais dificuldade de executar tarefas já que ficam mais dispersas, preocupadas com os filhos.
Sendo assim, estereótipos podem e devem ser combatidos, principalmente no ambiente corporativo.
Como lidar com a interseccionalidade nas empresas?
Diante de tudo que foi visto, é preciso trabalhar o planejamento estratégico da empresa integrado a políticas de DEI e com essa visão interseccional.
Por isso, seguem algumas dicas para que a interseccionalidade nas empresas seja compreendida por meio de ações.
Evite julgamentos padronizados
Uma mulher branca não têm as mesmas dificuldades que uma mulher negra. E uma mulher negra não possui as mesmas dificuldades que outra mulher negra, visto que há outros aspectos que perpassam a vida de cada uma.
Tenha um olhar interseccional e evite comparações generalistas.
Pratique a comunicação inclusiva
Em comunicados internos ou campanhas externas, preste atenção na imagem que a empresa está passando. A linguagem utilizada busca ser inclusiva? E as imagens usadas em campanhas de marketing, costumam mostrar grupos diversos de pessoas?
Considere a aceleração de carreira para grupos minorizados
Ao considerar a interseccionalidade, é válido investir em ações afirmativas nas empresas. Isso inclui ter um olhar específico para a progressão dos planos de carreira de grupos minorizados dentro da organização.
Crie estruturas de segurança para denúncias
A empresa trabalha para que casos de racismo ou qualquer outro tipo de discriminação nunca ocorram, mas sabemos que eles ainda podem acontecer.
Portanto, as pessoas precisam sentir que estão em um espaço corporativo preparado para acolher situações como essa. E que o ambiente possui canais que permitem o endereçamento seguro de casos de racismo, por exemplo.
Para continuar aprendendo outros conceitos relacionados à diversidade, leia o texto: “Lugar de fala: o que é e qual a sua importância nas políticas de diversidade e inclusão“.
Intencionalidade X tokenismo: quem ganha na sua empresa?
Quando discutimos diversidade e representatividade, logo surge um questionamento: mas qual o objetivo dessas iniciativas? Como o assunto está cada vez mais em voga, essa é uma pergunta legítima. Afinal, há muitas empresas que estão entrando na onda sem realmente se comprometerem com a causa. É aí que entra o debate entre intencionalidade e tokenismo.
Em um mercado no qual a disputa por talentos é crescente, ações de inclusão feitas apenas por marketing ou para evitar acusações de discriminação podem ser comuns. Por outro lado, é importante valorizar também iniciativas sérias de promoção da diversidade, pois há muitas organizações trabalhando nesse sentido.
Ficou com curiosidade? Neste artigo, vamos explicar o que significa intencionalidade, tokenismo e como você pode construir ações de inclusão realmente eficazes. Boa leitura!
O que é tokenismo?
Tokenismo é um termo que define a inclusão simbólica de grupos minorizados, sem mudanças na estrutura das organizações. O termo vem do inglês “token” (“símbolo”, em português) e foi utilizado pela primeira vez na década de 1960, no livro “Por que não podemos esperar”, de Martin Luther King.
Na época, Luther King utilizou essa expressão para questionar a ideia de que colocar alguns negros em posições de poder era suficiente para alterar a situação de opressão por todo o grupo. Ele questionava a falsa inclusão de apenas algumas pessoas negras com o único objetivo de passar uma imagem “progressista”, ou seja, apenas de forma simbólica.
Algum tempo depois, o termo passou a ser usado também no mundo corporativo, inclusive por outros grupos minorizados. A professora Rosabeth Moss Kanter foi uma das pesquisadoras do tokenismo. No caso dela, para descrever principalmente a situação das mulheres no mercado de trabalho.
Segundo Kanter, além do problema social do tokenismo (porque não representa uma mudança real, apenas simbólica), há também impactos para os colaboradores. Mesmo que tenham oportunidades, esses profissionais costumam sofrem com maior pressão no ambiente de trabalho, porque acabam ganhando mais visibilidade em comparação com seus colegas.
Além disso, os indivíduos são lançados à posição de “representantes” de seu grupo minorizado, mesmo sem terem essa intenção. Com isso, são consultados apenas para assuntos relativos a essas questões, enquanto não são ouvidos da mesma maneira para outros temas.
Um exemplo clássico é quando a única pessoa negra da equipe é convidada para falar nas redes sobre o mês da Consciência Negra. Ou quando aquele colaborador LGBT é chamado para dar seu depoimento sobre o Dia do Orgulho.
Porém, nem todas as ações de inclusão devem ser vistas como tokenismo. Existem empresas realmente comprometidas com a mudança social e que buscam promover a diversidade de maneira mais profunda. Nesses casos, podemos dizer que há intencionalidade.
O que é intencionalidade?
A intencionalidade é a prática da inclusão e diversidade com propósito e mudanças mais amplas. Não se trata apenas de contratar algumas pessoas de grupos minorizados, mas aplicar transformações na estrutura e na cultura da empresa.
Nesse caso, podemos dizer que a intencionalidade é o oposto do tokenismo, porque não se preocupa apenas com uma inclusão simbólica, mas sim em transformar o ambiente de trabalho.
Por isso, a diferença entre ambos não é meramente numérica. É possível promover a intencionalidade mesmo em empresas que ainda estão longe de alcançar a igualdade plena no quadro de funcionários. Trata-se de uma mudança qualitativa, que busca promover a equidade e o bem-estar dos profissionais envolvidos.
Nesses casos, é melhor que a empresa seja transparente e afirme: “estamos longe do que gostaríamos na presença de pessoas negras em nossa empresa e preferimos não expor aquelas que já estão conosco, construindo essa mudança”. Do que fazer ações de marketing sem amadurecer antes suas práticas internas.
Como construir ações de inclusão com intencionalidade?
Como você viu, é possível construir ações de diversidade e inclusão com intencionalidade. Mas isso passa por um comprometimento de toda a empresa, principalmente das lideranças. A seguir, listamos algumas dicas para começar. Olha só!
Invista em educação
O primeiro passo de uma empresa realmente comprometida com a diversidade é buscar informações. Hoje, existe muito conteúdo disponível para as organizações que querem entender o impacto da inclusão nos seus times. Além disso, há cursos, mentorias, palestras e outros formatos de aprendizagem que podem apoiar sua equipe nesse processo.
Ouça pessoas de grupos minorizados
Nós falamos que ouvir grupos minorizados apenas sobre suas pautas é tokenismo. Mas isso não significa que a empresa não deva escutá-los. Pelo contrário, é fundamental que essas pessoas sejam convidadas a participar das iniciativas de inclusão e diversidade. A questão é que elas devem se envolver o quanto se sentirem confortáveis e precisam de um espaço no qual possam ser sinceras. Principalmente quando têm feedbacks negativos a dar.
Faça mudanças culturais
Você também viu que transformações mais amplas são necessárias nas empresas que querem ser inclusivas. Afinal, os colaboradores que fazem parte de grupos minorizados precisam de um ambiente confortável para trabalhar.
Isso passa por mudanças na cultura organizacional da empresa, que deve valorizar a equidade, o diálogo sobre as diferenças e a transparência, para evitar vieses inconscientes.
Mexa nas estruturas
Outra forma de agir com intencionalidade e mostrar que a empresa tem um compromisso com a inclusão é mexer na organização interna. Não adianta contratar pessoas colaboradoras de grupos minorizados e mantê-las sempre nos cargos de menor senioridade ou com menores salários.
É importante que a empresa tenha um plano de cargos e salários adequado e transparente para todos os profissionais. Além disso, ações afirmativas são boas práticas para diminuir as lacunas entre esses grupos e os demais colaboradores. Seja no recrutamento ou na formação de lideranças, você pode reservar vagas e criar programas específicos de capacitação.
Conte com apoio especializado
Por último, vale considerar também apoio especializado. Hoje, existem consultorias que oferecem às empresas apoio para implementar ações de diversidade e inclusão com intencionalidade. Essas empresas podem apoiar seu time de Recursos Humanos e suas lideranças para promover mudanças em toda a equipe.
Entenda como funcionam as consultorias de diversidade e inclusão neste artigo e veja como nosso time pode ajudar a sua organização!